But i try..

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terça-feira, 6 de maio de 2014

Folha 21.

Eu vi,
Eu vi um Zepellin, eu deveria ter nesta época uns cinco ou seis anos, comia balas 7 belos, deixava feliz aquele pirocóptero de girar com as mãos cair em cima do telhado, comprava sonhos na padaria com a Eliana e metíamos o pé na lama.

Taí, João de Barro
era o nome do primeiro bairro de onde tenho as primeiras lembranças desta vida, bairro; se é que podia se chamar aquele amontoado de casas novas sendo construidas, terrenos sem cerca, crianças correndo soltas, pulando buracos, valetas, jogando futebol, bolitas, tacos, peão, empinando pipas em meio de muito barro vermelho e sacolas plásticas nos pés. Ah tinham as mães solteiras com filhos, tentando construir sua historia. (ou reconstruir.) Ali, naquele pequeno bairro que se formava, eu teria as mais belas historias pra contar.
Ali, eu começo a me lembrar da pequenina grande-mulher que me deu a vida. minha mãe.

Susete, era o nome dela.
Escrevia ainda com nome de solteira, tinha letra bonita (das de médica) daquelas indecifráveis. (Ela e a letra.) 6hrs da manhã, pulo da cama, beijo na gata Mimi, veste aquele blusão azul com boneco colorido estampado, a estampa era de tecido aveludado já a lã era azul, azul-celeste.
Salto na garupa da calói, e lá vamos nós; tchau até logo Mimi.
Vento no cabelo e algumas canções cantaroladas pelo caminho acompanhadas sempre por ela, naquela pressa mais suave da manhã corríamos entre buracos e esquinas, avenidas.. eu colava meu rosto em suas costas e apertava com meus braços pequenos sua cintura, fechava meus olhos e ali mesmo voava (ou dormia) naquela época, com a mente aventureira pensava eu que existiam sim, carros voadores. (como aqueles dos filmes do De Volta para O Futuro).

Café com leite, bolacha maria, colchonete, hora pra dormir, hora pra andar de balanço, hora do conto e pular na cama de mola, de montar castelinho (aqueles de tijolinho ou cubos de madeira)  sujar as mãos, mexer com abelhas, ter medo daquela boneca medonha sem cabelos, vacina na bunda, palhaço, choro, muito choro, CRÉCHE.

Lá no João de Barro, tinha a dona Maria fazia sua feijoada no fogão a lenha o seu João escutava seu programa diario (naquele radio-relogio) sempre fumando seu velho e bom palheiro. sempre dando aqueles bons conselhos:

_ Não pode engolir chiclé, senão gruda nas tripa ( e faz mal pro coração)
_ Coloca um chinelo nos pé, se não vai pegar uma friagem!
_ Não pode misturar melância com leite. Nem tomar banho depois de comer.

A mãe batia na porta, (abre a tramela!)
Já era hora, já era hora. Cansada, abatida, depois do trabalho integral nas casas, nos predios, nos bairros de cima. Já era hora, comida na mesa, alguma revistinha de pintar, cafuné e cama pra mim.
Já quase adormecendo, fechando meus olhos sonolentos ainda guardo em minha memoria, imagens daquela mulher de 23 anos, soltando seus cabelos negros em frente ao espelho e cantando musicas do cantor que ela mais gostava:

"Todos os dias
Antes de dormir
Lembro e esqueço
Como foi o dia
Sempre em frente
Não temos tempo a perder

Nosso suor sagrado
É bem mais belo
Que esse sangue amargo..


 ..escrevia, como estou te escrevendo agora.
as dela eram letras apressadas, eu criança não compreendia mas costumava pegar alguma caneta e fascinado já queria ter diálogos com a letra. Circulava, subia e descia lombas tremidas. Não sabia, mas já estava sendo.

Hoje sei que nas letras tortas, existe algo.
pra mim eram apenas montanhas, desenhos circulares no canto das folhas, âncoras, homem de óculos e cabelos encaracolados, rabiscos fortes e folhas amassadas.
Penso como transbordar-se e depois recompor-se do que foi esvaziado.
Ou seriam tolices que não foram ditas?

_ Já disse, minha mãe é indecifrável.








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